Bem vindo ao Via Consciência, um blog dedicado à comunicação conscienciológica, onde o ser humano em evolução é o principal tema de pesquisa.

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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Qual é o seu IDP ou Índice de Distância do Poder ?

O psicólogo holândes Geert Hofstede trabalhou no departamento de recursos humanos da matriz da IBM na Europa, nas décadas de 1960 e 1970. Na época, ele desenvolveu uma ampla pesquisa entre os funcionários da empresa para saber como as pessoas solucionavam problemas, como se relacionavam em grupo e de que maneira lidavam com a autoridade. Viajou o mundo apresentando seu longo questionário e montando um enorme banco de dados. O resultado dessa pesquisa foi tão rico que a informação obtida revelou como as culturas diferem entre si e deixou o legado das "dimensões de Hofstede," valiosos paradigmas usados até hoje pela psicologia intercultural.

Entre as muitas dimensões de estudo desenvolvidas por Hofstede, entre elas o "Controle de Incerteza," focada na análise da aceitação da ambigüidade e na dependência de regras e planos, e a "Escala Individualismo-coletivismo," destaca-se aqui o IDP (Índice de Distânia do Poder), que analisa as atitudes em relação à hierarquia, mais especificamente ao nível em que uma sociedade respeita uma autoridade. Hofstede preparou uma lista de perguntas para saber se os entrevistados tinham medo de dizer que discordavam dos seus supervisores, em que medida os membros menos poderosos das organizações e instituições aceitavam e esperavam que o poder fosse distribuído de forma desigual, qual era o nível de respeito e temor pelos mais velhos e se os detentores do poder tinham direitos e privilégios iguais. Sobre os resultados, Hofstede diz que "em países com baixo IDP, o poder é algo de que seus detentores quase se envergonham e que tentam minimizar."

O efeito das descobertas de Hofstede nos setores do meio corporativo, em que o trabalho depende da responsabilidade e do conhecimento técnico de uma só pessoa, foi tremendo e promoveu mudanças significativas no modus operandi local, a fim de evitar desastres e perdas memoráveis. O trabalho em equipe foi valorizado e o information share foi colocado em prática de forma ostensiva, mas todas as mudanças efetivas não dependiam apenas de um paradigma, mas de uma transformação cultural, de modo que a democratização ganhou mais contornos ornamentais do que processos metamorfósicos sérios. Esse mesmo índice pode ser utilizado para analisar as nossas ações diárias e nossa relação com o poder. Em termos práticos, a dimensão em que o IDP de Hofstede se encontra coloca em debate os perigos do excesso de ações circulares nos processos burocráticos (dispersões, vícios e incertezas), a lentidão da funcionalidade (complexidades aniquiladoras), a falta de procedimentos eficazes na gestão de probelmas (desorganização pessoal) e também o retardamento de decisões nas soluções práticas do dia-a-dia (postergação).

Todos esses "sacrifícios" da gestão burocrática e centralizadora, nos meios de alto IDP, refletem infelizmente números mais dramáticos. Vamos analizar um grave problema causado pela centralização de poder na aviação - diga-se, causa de inúmeros desastres aéreos. No vôo 052 da empresa Avianca, o poder estava nas mãos do piloto, mas a conversa com a torre de comando do aeroporto Kennedy em Nova Iorque estava sob a responsabilidade do co-piloto do avião, que falava inglês. O resultado de uma precária comunicação revelou uma formalidade excessiva entre piloto, co-piloto e engenheiro de bordo, o difícil entendimento prático entre piloto e co-piloto e deste último com o controlador de vôo americano, mostrou uma centralização de decisões em um só homem e por fim um "certo" descompromisso do co-piloto, que nada poderia fazer além de passar as informações traduzidas para o homem das decisões ao seu lado. O 707 caiu na propriedade do pai do campeão de tênis, John McEnroe, em Oyster Bay, Long Island, e dos 158 passageiros a bordo, 73 morreram. O desastre aconteceu sem que houvesse um só problema com o avião. A causa do acidente foi revelada no dia seguinte: falta de combustível. Com o intenso trafego aéreo em Nova Iorque naquela noite chuvosa, o avião colombiano ficou sobrevoando a região por um tempo imprevisto e o combustível do avião simplesmente acabou. A Colômbia é um país com alto IDP.

Em outro caso, num vôo de Dubai à Nova Iorque da empresa Emirates, uma passageira teve um derrame a bordo e o piloto americano teve apenas alguns minutos para pensar numa solução a fim de salvar a vida da mulher. O avião sobrevoava Moscou muito antes da metade do caminho e toda a tripulação imediatamente se envolveu no caso. O piloto trabalhou em equipe. Como aquele era um vôo muito longo, havia uma tripulação reserva, que logo se pôs de pé e foi para a cabine, juntando-se à que estava em operação. Enquanto um montava o atendimento médico em terra, o outro estudava o plano do aeroporto de Helsinki, onde o avião iria pousar emergencialmente. Enquanto isso, havia quem estivesse cuidando da comunicação com a torre e quem estivesse com a atenção no avião no ar, pois o perigo residia no fato da aeronave estar com o tanque cheio, condição desastrosa para pouso. Jogar gasolina no mar ou por terra não era ecologicamente correto, de modo que tiveram que mobilizar autoridades do aeroporto em Helsinki para um pouso contra o vento, para diminuir o impacto contra o solo. Todos no 747 da Emirates se revesaram em vários assuntos, distribuíram responsabilidades, dispersaram o estresse e agilizaram o atendimento à passageira, atuando não só de forma eficiente, mas de maneira eficaz, de maneira que o avião pousou em Helsinki com segurança e a mulher foi por fim devidamente atendida. Os Estados Unidos é um país com baixo IDP. "Se as listas de países com altos IDPs de pilotos forem comparadas ao número de acidentes por país, encontraremos uma correspondência quase perfeita," diz Malcolm Gladwell, no seu livro Fora de Série, fonte do presente assunto.

A maneira como nós lidamos com o poder pode nos colocar ou não em posição de choque com os interesses da coletividade. O poder não produz liderança, e sim o contrário, com base na confiança. A autoridade não se impõe, se conquista. Em maior ou menor escala, estamos sempre envolvidos e atuando com o poder na vida diária, seja ele real ou almejado, com lucidez ou devaneio. Costumamos retroalimentar egos, fomentar disputas e bradar auto-afirmações sem fins lucrativos, apenas com base no desejo de poder. A má utilização das nossas potencialidades (nosso verdadeiro poder), por fim, acaba por se voltar contra nossos próprios objetivos e atravanca os caminhos onde as ferramentas para o completismo das nossas ações devem triunfar. Conforme dito acima, todos esses "sacrifícios" de uma gestão centralizadora, com alto IDP, refletem também números pessoais igualmente dramáticos: comunicação precária com o mundo à nossa volta, preconceitos, elitismos, arrogância, dispersões, vícios, incertezas, postergações, complexidades aniquiladoras, objetivos irreais, desorganização pessoal e por fim a frustração.

Qual é o nosso IDP, Índice de Distância do Poder, centralizador e autocrata ?

Um comentário:

  1. Muito bom Mário! Estou numa empresa onde experiencio toda esta problemática do Poder e da Comunicação, com muitos prejuízos para os funcionários, empresa e sociedade em geral.

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